violência

Após sete anos, Santa Maria registra queda no número de homicídios

Camila Gonçalves

Foto: Renan Mattos (Diário)
Glênio dos Santos mostra a foto da filha ainda criança. Ana Elisiane foi morta e enterrada em um chiqueiro

Na manhã de 22 de agosto de 2018, a equipe da Delegacia de Polícia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DPHPP) de Santa Maria bateu à porta de uma casa na Vila Pôr do Sol, Bairro Nova Santa Marta, região oeste da cidade. Com um mandado de busca e apreensão em mãos e apoio de bombeiros, Brigada Militar, Guarda Municipal e de uma retroescavadeira da prefeitura, os policiais derrubaram um chiqueiro de alvenaria que recém havia sido construído e encontraram um corpo enterrado no pátio da casa.

Lá, sob o chiqueiro, estava o corpo de Ana Elisiane Bastos dos Santos, 25 anos, uma das 57 pessoas assassinadas em 2018 em Santa Maria. O total de assassinatos de 2018 foi 20% menor em relação a 2017 e representou a primeira queda na estatística desde 2012. Dessas mortes, três foram latrocínio, que é o roubo com morte, e um assassinato não foi considerado crime, pois foi cometido por uma criança de 9 anos, que confessou ter atirado em um amigo, por acidente, ao mostrar uma arma de fogo.

No total, a Polícia Civil prendeu 62 adultos e apreendeu 11 adolescentes. O número de adolescentes envolvidos foi maior em 2018. Em 2017, nove adolescentes foram recolhidos ao Centro de Atendimento Socioeducativo (Case). Segundo o delegado Gabriel Zanella, titular da DPHPP, é cada vez menor a idade dos suspeitos desse tipo de crime.

- São indivíduos de 13, 14 anos. Ao contrário dos adultos, eles têm maior propensão a confessar o crime para ganhar status e não demonstram nenhum tipo de arrependimento em relação à prática delitiva - conta o delegado.

Os adolescentes também se orgulham de alcançar a maior idade para poder ir para a Penitenciária Estadual de Santa Maria (Pesm). Um dos jovens apreendidos no ano passado já tinha 18 anos quando cometeu o seu terceiro homicídio. Ele comemorou a ida para a Pesm, segundo o delegado. Um dos motivos é a conquista do respeito no mundo do crime e a ascensão como liderança nas galerias da penitenciária.

MENORES DE 18 ANOS
Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), menores de 18 anos não podem responder criminalmente por seus atos infracionais. Se um adolescente comete um homicídio, vai para uma unidade de internação, onde aguarda ser julgado pela Vara da Infância e Juventude. Se a autoria fica comprovada, é submetido a medidas socioeducativas, como a privação da liberdade, podendo ficar até três anos internado.

Para o professor Eduardo Pazinato, especialista em Segurança Pública e coordenador do Núcleo de Segurança Cidadã da Fadisma, a ligação de adolescentes em homicidios é uma tendência nacional. O freio na participação dos jovens nos crimes contra a vida depende da participação do município, construindo alternativas para essa parcela da sociedade.

Um exemplo, em termos de Estado, são os Centros da Juventude, criados pelo governo Tarso Genro (PT) e com continuidade no governo José Ivo Sartori (MDB). Os espaços existem em Porto Alegre, Alvorada e Viamão e oferecem qualificação profissional e atividades de lazer a jovens entre 15 e 24 anos.

AUSÊNCIA QUE DESESTRUTURA FAMÍLIAS
Apesar de o número de assassinatos em Santa Maria ser o mais baixo desde 2016, as famílias de quem integra as estatísticas sofrem impactos emocionais, financeiros e estruturais sem proporções. Ana Elisiane, por exemplo, deixou dois filhos, de 1 e 7 anos de idade.

Ainda adolescente, Ana Elisiane, que era usuária de drogas, começou a sumir de casa. Para sustentar o vício, prostituía-se. Antes de completar 1 ano de idade, ela foi abandonada pela mãe. Depois disso, a criação dela ficava entre a casa do pai, Glênio Rodrigues dos Santos, 50 anos, e a casa da avó e das tias Eliane Fonseca, 44 anos, e Eligiane Fonseca, 40. Segundo a família, foi feito de tudo para ajudar Elisiane, a "Guinha", como era carinhosamente chamada.

- Ela foi internada três vezes. Antes dos 15 anos, ela saía para a rua. A gente dava uma de detetive. Onde diziam que tinham visto ela, a gente ia atrás, pegava e trazia ela para casa - contou Eliane, que a amamentou quando criança.

Ana Elisiane foi morta com golpes de faca, colocada em um saco de uso agrícola e enterrada embaixo de um chiqueiro. Dois homens, um de 34 e outro de 57 anos, foram presos preventivamente, suspeitos de envolvimento com a morte a jovem. A motivação, segundo o que apurou a investigação, estava relacionada ao tráfico de drogas.

Ao saber da notícia do cadáver encontrado no bairro, Eliane, que mora na mesma região, ficou espantada com a violência da morte e pela forma como os assassinos ocultaram o cadáver. A tia não imaginava que o corpo era da sobrinha. Como Ana Elisiane não tinha telefone ou residência fixa, o sumiço dela nos últimos 30 dias não espantava a família.

Já Eligiane, que pediu a adoção do filho mais novo de Elisiane, estava procurando a jovem para assinar o processo na Justiça. Só quando a polícia procurou a família para identificar o corpo é que ficaram sabendo do desfecho da história da jovem.

TRÁFICO E RIXAS
Dos casos solucionados pela polícia, 40% estavam relacionados a tráfico de drogas, a exemplo de Ana Elisiane. Outros 40% tinham a ver com desavenças e rixas, e 20% eram ligados a motivos diversos. O último grupo inclui mortes por briga familiar, dinheiro ou ciúme.

- Em muitos crimes, a pessoa estava devendo pouca quantia de dinheiro ao tráfico. São situações que a polícia e as autoridades falam, e a família não se conscientiza - explica o delegado Zanella.

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